Assista aos filmes e séries indicados e veja como o cinema retrata a história
filmes e séries
UM Dia das Crianças PRa LÁ DE encantado

O escritor e contador de histórias Giba Pedroza prepara atualmente um novo programa na TV Cultura (SP): “Contos Ra Tim Bum”
Giba Pedroza,
escritor, pesquisador e contador de histórias,
indica três filmes que conversam com histórias inspiradas na literatura infantil e na literatura oral tradicional de diferentes povos. São adaptações que fogem ao padrão dos grandes estúdios e podem trazer um encantamento ainda maior ao Dia das Crianças. Pra chamar a molecada!
Por Giba Pedroza¹
Publicado em 11 de outubro de 2021
Foto: Divulgação Giba Pedrosa
ERNEST E CELESTINE (2012)
Onde mora o medo do outro?

"O filme Ernest e Celestine nos faz pensar que precisamos nos cuidar mais, em todos os sentidos."
Os ratos vivem embaixo, no subterrâneo. Os ursos vivem em cima, sobre a terra. Os ursos desprezam e têm medo dos ratos. Os ratos ignoram e têm medo dos ursos.
Mas como não querer cuidar daquele urso grandalhão, desajeitado, músico de rua, de vida solitária? E como não querer cuidar daquela ratinha órfã, assustada, frágil, irreverente e divertida?
Ernest e Celestine cuidam um do outro em uma animação que mais parece um belíssimo livro em movimento, saído da obra de Gabrielle Vincent, uma artista belga que colocou a literatura para crianças no lugar que ela merece, em uma obra com ilustrações dominadas pelo carvão, as sombras.
Os realizadores contam da dificuldade e do prazer que foi conceber o filme, procurando ser fiéis ao máximo ao trabalho desta grande ilustradora e escritora. Conseguiram muito mais que isso. Certa vez, perguntaram a uma criança o que uma história precisava para ser uma boa história. E ela respondeu: “uma boa história tem que fazer rir, ou fazer chorar, ou sentir um medinho, ou fazer pensar”.
Ernest e Celestine tem tudo isso. E nos faz pensar que precisamos nos cuidar mais, em todos os sentidos.
ERNEST E CELESTINE
Animação: França, 2012, 1h16min
Classificação: Livre
Direção: Benjamin Renner, Vincent Patar, Stéphane Aubier
Elenco (vozes): Lauren Bacall, Lambert Wilson, Pauline Brunner
Onde assistir: Internet
O Conto da
Princesa Kaguya (2015)
Um filme para ver trocando cafunés

"Uma linda metáfora sobre o que o destino nos reserva e a simplicidade que deixamos para trás quando crescemos."
Sabe aquela sensação de estar diante de um quadro, uma obra de arte, e se sentir dentro dele? Ou ao mesmo tempo, querer estar passeando por aquelas paisagens e imagens?
Pois os nossos olhos parecem deixar o corpo e nos vemos dentro de tanta plasticidade e de tanta luz nesta animação, que conta uma das mais antigas e tradicionais lendas do Japão, presente em "onze de cada dez" coletâneas de contos populares publicadas no país.
A história da menina, princesa do reino da Lua, que foi encontrada dentro de um tronco de bambu por um camponês cortador de bambu, é também uma linda metáfora sobre destino, sobre egoísmo — o que o destino nos reserva e a simplicidade que deixamos para trás quando crescemos.
A luminosidade, a trilha sonora, o enquadramento e o ritmo fogem muito do padrão a que as crianças se acostumaram a consumir dos grandes estúdios de animação, e talvez este seja o grande mérito do filme. Mesmo que a história se alongue um pouco do meio para o final, que incorpore outras narrativas dentro da mesma trama, até os mais pequenos vão se encantar e beber as lindas imagens e a belíssima música.
Um filme para ver trocando cafunés. Foi assim que vi com a minha filha de quatro anos que acabou dormindo e me disse, no dia seguinte, que o filme “sonhou dentro dela”, pedindo para continuar a assistir de onde parou.
Do mesmo realizador de outros celebrados filmes da animação japonesa como Meu Amigo Totoro e o recente Castelo No Céu.
O Conto da Princesa Kaguya
Animação: Japão, 2015, 2h17min
Classificação: Livre
Produção: Studio Ghibli
Direção: Isao Takahata
Adaptação: Anime baseado no conto Cortador de Bambu ou Princesa Kaguya, uma narrativa popular japonesa do século 10
Elenco (vozes): Aki Asakura, Kengo Kora, Takeo Chii
Onde assistir:
Netflix
Pinochio (2019)
Em uma das mais belas versões

"Dá vontade de ver muitas vezes e faz parte daquele tipo de obra de arte que foge muito da pecha de 'historinha' para crianças."
No meu trabalho com as crianças, gosto sempre de mostrar a elas que uma mesma história pode ser contada muitas vezes, de formas diferentes, com tonalidades diferentes de cor, de intensidade, de humor, de poesia, de ritmo, utilizando recursos e linguagens artísticas diferentes, mas sem nunca ferir sua essência, sem tirar sua beleza e integridade.
Este filme italiano é uma das mais belas versões do clássico infantil Pinocchio, que ficou muito popular na versão da Disney. Embora nunca deixe de reconhecer a importância e a contribuição das obras dos estúdios Disney para o universo infantil, me incomoda um pouco o processo de adocicar muitos contos clássicos e associar a imagem de vários personagens diretamente a este produtor. E Pinocchio, talvez, seja um dos que mais tenha sofrido com isso.
Pinocchio foi uma história criada por Carlo Collodi e publicada em capítulos em um jornal italiano, em 1881. A história fez tanto sucesso que o autor havia encerrado a história com o fim do personagem central, quando choveram cartas do público pedindo a ele que não “matasse” o boneco e que a história continuasse, o que foi atendido.
Na versão original, o grilo falante é bem diferente, a fada também e, no lugar de uma baleia, temos um peixe gigante com cara de cachorro (o que, convenhamos, é muito mais mágico).
O filme tem uma fotografia apurada, um ritmo muito bom permeado de um humor corrosivo, que é irônico e poético ao mesmo tempo. Dá vontade de ver muitas e muitas vezes e faz parte daquele tipo de obra que é arte e foge muito da pecha de “historinha”, “filminho” para crianças — como muitas vezes as pessoas costumam dizer, usando o diminutivo.
Este é um grande filme que ainda conta com a presença do ator Roberto Benigni na pele de um Gepeto que parece inverter a lógica e é tão articulado quanto o boneco que criou.
Pinocchio
Produção: Itália, 2019, 2h05min
Classificação: 10 anos
Direção: Matteo Garrone
Adaptação: Baseado no romance As Aventuras de Pinóquio, escrito por Carlo Collodi (1883)
Elenco: Roberto Benigni, Federico Ielapi
Onde assistir:
GooglePlay
Para ler depois de ver
O nascimento de Celestine, Gabrielle Vincent, Editora 34. Um livro para guardar em lugar especial na estante. Para ser folheado sempre e descobrir, a cada vez, novas nuances e detalhes. Aqui, o urso Ernest conta como encontrou Celestine em uma lata de lixo, numa manhã fria e a levou para casa, para cuidar dela (o que não aparece no filme).
Histórias Tecidas Em Seda, Lucia Hiratsuka, Cortez Editora. Uma das mais importantes artistas da literatura infantil brasileira nos brinda com este belo livro de lendas tradicionais japonesas, nas quais fica evidente toda a vitalidade e encantamento das narrativas. Lúcia é uma grande ilustradora que mantém toda a riqueza da arte tradicional do Japão, ficando à altura dos contos.
As Aventuras de Pinóquio, Carlo Coloddi, Editoria Cosac Naif. Uma das melhores edições do clássico Pinóquio no Brasil. Aqui, o texto é publicado exatamente como foi apresentado ao público pela primeira vez, nos capítulos que saíam no jornal. Traz ainda rascunhos e ilustrações originais do autor e um belíssimo posfácio de Italo Calvino.